domingo, 3 de julho de 2011

Bicicleta de Recados


Na minha bicicleta de recados
eu atravesso a madrugada dos poemas

pedalo nas palavras atravesso as cidades

bato às portas das casas e vêm homens espantados

ouvir o meu recado ouvir a minha canção.


Na minha bicicleta de recados
eu vou pelos caminhos.

Vem gente para a rua a ver a novidade

como se fosse a chegada

do João que foi à Índia

e era o moço mais galante

que havia nas redondezas.

Eu não sou o João que foi à Índia

Mas trago todos os soldados que partiram

e as cartas que não escreveram

e as saudades que tiveram

na minha bicicleta de recados

atravessando a madrugada dos poemas.

Desde o Minho ao Algarve
eu vou pelos caminhos.

E vêm homens perguntar se houve milagre

perguntam pela chuva que já tarda

perguntam pelos filhos que foram à guerra

perguntam pelo sol perguntam pela vida

e vêm homens espantados às janelas

ouvir o meu recado ouvir a minha canção.

Porque eu trago notícias de todos os filhos
eu trago a chuva o sol e a promessa dos trigos

eu trago a vida

na minha bicicleta de recados

atravessando a madrugada dos poemas.
(Manuel Alegre)

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